Dia Mundial da Poesia

por | 21/03/2020 | Poesias | 0 Comentários

Autor(es): João Cabral de Melo Neto

Lançamento: 1955
uma mão segurando o livro, com uma estante de livros ao fundo

Morte e vida Severina, de João Cabral de Melo Neto, Ed. Alfaguara. Foto: Acervo Recanto da Literatura

A poesia está entre as mais antigas formas de arte literária, existindo antes mesmo da escrita. Então, nada mais justo do que ter uma data especial só para ela.

O Dia Mundial da Poesia é comemorado no dia 21 de Março e foi criado na 30ª Conferência Geral da Unesco, no dia 16 de Novembro de 1999, com o objetivo de promover a leitura, escrita, publicação e ensino da poesia. No Brasil comemoramos o Dia da Poesia no dia 14 de março, data escolhida em homenagem ao nascimento do grande poeta baiano Castro Alves.

Hoje nós homenageamos todos os poetas, os consagrados e aqueles que têm a poesia dentro de si, mas ainda não se revelaram ao mundo!

E para ilustrar, um trecho de “Morte e Vida Severina”, de 1955, escrito pelo pernambucano, João Cabral de Melo Neto, um dos maiores poetas de língua portuguesa, cujo centenário comemoramos neste 2020. O poema dramático regionalista e modernista, narra a jornada de um retirante da seca, Severino, que sai do sertão de Pernambuco, em busca de uma vida melhor na capital e se depara com a miséria da vida na cidade grande.

 

O meu nome é Severino,
não tenho outro de pia.
Como há muitos Severinos,
que é santo de romaria,
deram então de me chamar
Severino de Maria;
como há muitos Severinos
com mães chamadas Maria,
fiquei sendo o da Maria
do finado Zacarias,
mas isso ainda diz pouco:
há muitos na freguesia,
por causa de um coronel
que se chamou Zacarias
e que foi o mais antigo
senhor desta sesmaria.
Como então dizer quem fala
ora a Vossas Senhorias?
Vejamos: é o Severino
da Maria do Zacarias,
lá da serra da Costela,
limites da Paraíba.
Mas isso ainda diz pouco:
se ao menos mais cinco havia
com nome de Severino
filhos de tantas Marias
mulheres de outros tantos,
já finados, Zacarias,
vivendo na mesma serra
magra e ossuda em que eu vivia.
Somos muitos Severinos
iguais em tudo na vida:
na mesma cabeça grande
que a custo é que se equilibra,
no mesmo ventre crescido
sobre as mesmas pernas finas,
e iguais também porque o sangue
que usamos tem pouca tinta.
E se somos Severinos
iguais em tudo na vida,
morremos de morte igual,
mesma morte severina:
que é a morte de que se morre
de velhice antes dos trinta,
de emboscada antes dos vinte,
de fome um pouco por dia
(de fraqueza e de doença
é que a morte severina
ataca em qualquer idade,
e até gente não nascida).
Somos muitos Severinos
iguais em tudo e na sina:
a de abrandar estas pedras
suando-se muito em cima,
a de tentar despertar
terra sempre mais extinta,
a de querer arrancar
algum roçado da cinza.
Mas, para que me conheçam
melhor Vossas Senhorias
e melhor possam seguir
a história de minha vida,
passo a ser o Severino
que em vossa presença emigra.

 

Feliz Dia Mundial da Poesia!

 

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Mariana Gago

Advogada e entusiasta do papel transformador dos livros. Idealizadora e editora do projeto Recanto da Literatura.

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